Em recente viagem à Turquia, um dos locais mais interessantes que visitei foi a cidade de Pérgamo, que fica ao lado do mar Egeu e foi um grande centro da cultura, arte e medicina do mundo antigo. Todos já ouviram falar da Biblioteca de Alexandria, mas a segunda maior biblioteca da Antiguidade ficava em Pérgamo. Tinha 200 mil pergaminhos. Aliás, pouca gente sabe que o nome dessa cidade deu origem à palavra pergaminho, que era feito de couro e se usava para a escrita de livros.
O que mais me impressionou em Pérgamo foi o hospital, que tem quase 2.200 anos de história. Foi construído pelo rei Atalo III, por volta do ano 150 antes de Cristo. Esse rei era tão entusiasmado pela medicina que abandonou o seu poder de governante para se dedicar ao seu hospital, o centro médico de Asklepieion (pronuncia-se “Esculápio”), o maior e melhor de sua época em todo o mundo.
Já naquela época, o hospital de Pérgamo fazia tratamentos psicoterapêuticos. Na primeira fase do tratamento, os pacientes encenavam uma peça em um teatro para 3.500 pessoas, junto ao hospital. Na segunda fase, sentavam-se em torno de uma fonte que consideravam sagrada, e tomavam dessa água. Na fase seguinte, ficavam debaixo de um bosque lendo pergaminhos sobre assuntos diversos, com orientação médica.
Na quarta fase, os pacientes atravessavam um túnel de 300 metros com água correndo suavemente nas paredes laterais. Estive dentro desse túnel: ele tem algumas aberturas, onde os médicos ficavam dizendo frases de autoestima. O paciente ia escutando as frases, que faziam eco no túnel e se misturavam com o ruído da água.
A etapa seguinte consistia em uma massagem de óleo e barro em todo o corpo. E na sétima (última) fase, o paciente andava descalço para equilibrar sua energia. O tratamento era gratuito para os moradores da cidade e os pacientes que vinham de fora pagavam. Assim também o teatro, que era usado como parte da terapia, mas também funcionava para apresentações em geral.
O que podemos perceber nesse tratamento que acabo de relatar? Que se parecia com o que é feito hoje nas clínicas de SPA. Todos sabem o que é SPA, mas nem todos sabem que essa sigla veio de uma expressão em latim, do tempo de Roma antiga: “Sanitas Per Aquas”, que significa “saúde pelas águas”. Além disso, os terapeutas de Esculápio, há 2.200 anos, já aplicavam técnicas de relaxamento, como massagens, água correndo de leve para acalmar a alma, palavras de autoestima, paz, teatro e uma boa leitura.
O mundo mudou bastante, a tecnologia criou um estilo de vida completamente diferente, mas as pessoas continuam sendo essencialmente semelhantes. Até hoje aqueles recursos terapêuticos usados na antiga Turquia têm efeitos muito benéficos. De certa forma, quando carregamos algum problema que nos aflige psicologicamente, precisamos nos desapegar da situação que gerou aquele problema.
Lembrei-me disso ao encontrar, na entrada do Centro Médico de Esculápio, um pequeno mastro de pedra com duas cobras esculpidas. Até hoje, a cobra é o símbolo da medicina, em todo mundo, um símbolo que foi usado pela primeira vez lá em Pérgamo. A moça que trabalhava como guia do nosso grupo, Kunru Safak, me explicou isso em poucas palavras, quando olhei para aquela figura em relevo: “A cobra troca de pele e a cura é sempre uma troca da doença pela cura.”
Por essas e outras é que costumo dizer que “a viagem é mais importante que o destino”. Viajar é uma forma extremamente agradável de aprendermos sempre.